quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Capitulo 16 - ''We’re going to die! I can’t breathe! ''


Realmente, pelo menos ele tinha a sua mãe por perto e eu não tinha mais a minha e nem sequer tive direito a um último “adeus”. –At least you have your mom. –repeti, deitando-me no seu colo de novo, deixando-o afagar-me o cabelo.

A minha cabeça estava um caos. De um lado a revolta perante uma morte injusta de quem ainda tinha tanto por viver, por descobrir. Do outro, uma tristeza e um vazio descomunal. Uma sensação verdadeiramente indescritível que só quem passa por ela consegue entender mas que eu, sinceramente, não desejo a ninguém. O sorriso que não mais iria ver; os cabelos claros como o Sol, macios com que me divertia em criança e nos quais não voltaria a tocar; a segurança transmitida pelo seu olhar, mesmo quando ela, lá no fundo, se encontrava desesperada e sem ver soluções; a voz sempre doce com que me embalou; enfim, tudo me invadia os pensamentos, sufocando-me!

-Shannon, while you were talking to your mom I figured out that I’ll never talk to mine again, I’ll never be able to hear her voice telling me “it’s just fine”… -desabafei entre soluços.

-Oh baby… I don’t really know what to say. -lamentou ele.

-Don’t. There is nothing you can say right know to make it stop so don’t say anything, please. –implorei levantando-me, sacudindo as lágrimas e indo para a janela. Ao fundo avistava-se o Sol apesar do dia estar gélido, o que parecia um contrassenso (tal como tudo naquele momento).

Passada não mais de meia hora chegou Constance, e depois Jared.
A primeira parte até correu bem, apesar do silêncio constrangedor que se instalou perante a desgraça que entrara naquela casa com o telefonema de David. Porém, a partir de um certo ponto tornou-se insuportável para mim, tendo abandonado a mesa de forma abrupta, sem proferir uma única palavra. O baterista ainda se levantou com o intuito de me seguir mas foi parado pelo irmão que achava que eu devia ficar sozinha, e com razão.
Corri para junto da piscina e sentei-me à sua beira, tendo ficado a apreciar as folhas secas que boiavam na água límpida que refletia uma imagem clara da paisagem em redor. Acabei por perder a noção do tempo mas, para ser franca, nem sei o que estive a fazer. Quando dei por mim, já o Sol se punha.

-Rita? –ouvi chamar mas permaneci imóvel. Era Constance. –Why don’t you go back inside?

-Constance, I’m sorry about today. I know it’s stupid but seeing you with your children made me remind that I won’t have a moment like that anymore. Never again… -defendi-me, sentindo lágrimas a escorrer pela face.

-I’m so sorry! –abraçou-me e conduziu-me para dentro. No interior, os dois irmãos comentavam algo mas calaram-se ao meu passar.

-I already bought two fligths for tomorrow. –informou o mais velho, com ar incomodado. Acenei. Notava-se que o meu estado o deixara apreensivo e aflito. Pudera!

-Hey, hum, I talked to Annie and she’s comimg, ok? –inquiriu retoricamente o cantor.

-I’ll be upstairs. –declarei e subi. Nem a vinda de uma das minhas melhores amigas conseguiu arrancar-me um sorriso que fosse. Queria apenas desaparecer, esconder-me num buraco qualquer bem longe onde não houvesse barulho, luz... nada, ninguém! Só eu e a minha quietude, o meu silêncio.

Passei a noite às voltas, não consegui dormir nada nem permiti que Shannon o fizesse, dada a agitação.
Partimos cedo para Portugal mas já chegámos tarde não só dadas as horas de viagem mas também devido às diferenças do fuso horário.
Faltava pouco para aterrarmos, por volta de meia-hora, quando começámos a sentir uma trepidação súbita. As “cortinas” das janelas tremiam, assim como tudo o que dentro do meio de transporte se encontrava.

Caros passageiros, daqui fala o comandante. Queria pedir-vos que apertem os cintos segurança e mantenham a calma. Dadas as condições atmosféricas adversas, seremos obrigados a fazer um pequeno desvio da rota original, não sendo contudo caso para alarme. Obrigada.”, ouviu-se nas colunas. Apesar do apelo à calma foi o suficiente para quase entrar em pânico. Comecei a sentir falta de ar e suores frios por todo o corpo.

-We’re going to die! I can’t breathe! -apertei, com a mão esquerda, a perna de Shannon e levei a outra ao peito.

-Hey, easy! –fitou-me preocupado. Virou-me para si. –Rita... Rita, look at me! –procurou contacto visual. –We are fine, ok? There is nothing wrong with the plane, ok?

-I can’t breathe! –proferi em voz quase sumida, começando a tossir e baixando a cabeça.

-Focus, focus! Look up, come on! –inclinou-me suavemente para cima. -I want you to close your eyes and take a deep breath. Imagine your are in Papaya, ok? Everything is quiet; the sun is hot but not too hot, ok?

-Where? –fitei-o de esguelha, confusa, e ainda sem conseguir controlar a respiração.

-Pa... “Papaya”, “Popaia”, “Papapa”... that place you told me about... –tentou atrapalhado.

-Papôa! –esclareci enquanto tirava o casaco, na esperança de melhorar.

-Yes, that. Well, imagine you’re there. You’re listening waves and birds. You’re feeling relaxed and you have no problems there… Everything is just fine! -relatou delicadamente, com segurança na voz tipicamente enrouquecida. Lentamente comecei a melhorar. –Thank god! –abraçou-me fortemente.

-Easy!

Após um atraso de quase uma hora e meia, lá aterrámos. Passados os paranóicos controlos de segurança e a irritante espera pelas malas, pudemos finalmente apanhar um táxi que nos deixou ao fundo da minha rua. Atravessámo-la discretamente, como quem vagueia silenciosamente por lugar incerto. Ouvia-se, atrás de nós, o barulho aborrecido e constante das rodas pequeninas na calçada.
Ao portão estaquei.

-We’re home. –anunciei puxando o ferrolho metálico. –Come on. –Subi os três degraus da entrada e bati à porta. Poucos segundos depois apareceu David.

-Rita! –abraçou-me, fazendo-me largar as malas que quase tombaram sobre Shannon.

-David! –cumprimentou o baterista que apenas tinha estado com o meu irmão duas ou três vezes. Trocaram um abraço curto e entrámos sem mais demoras.

Depositámos a bagagem no meu quarto e dirigimo-nos à sala num ápice, onde se encontrava o meu pai que nem se apercebeu da nossa chegada. Estava sentado na sua poltrona coberta com uma manta grená para não se gastar nem sujar. Na mão segurava uma fotografia que remontava ao início da década de noventa que tínhamos tirado em família numa tarde solarenga de Verão, no Jardim Zoológico. David pela sua mão do meu pai e eu, uma vez que era mais nova, ainda ao colo da minha mãe, uma senhora bem constituída, de cabelos de ouro e cheiro a um perfume intenso cujo nome nunca soube mas que cedo aprendi a reconhecer e a adorar.

-Pai! –corri para diante dele, aguardando resposta. Na cara possuía um penso no lado direito da testa, assim como uma negra “em mau estado” junto do olho e tinha um braço engessado.

-Filha, chegaste! –reagiu. Levantou-se lentamente e recompôs-se. Agarrei-o com força, num misto de tristeza e simultaneamente de alívio por encontrá-lo ali. –A tua mãe não...

-Eu sei. –calei, chorando.

-Pois, claro. –respirou fundo. –Foi tudo tão rápido que eu ainda nem acredito.

-I’m really sorry, sir! –lamentou Shannon que não sabia traduzir, embora não tenha sido necessário.

-Obrigada. –devolveu, voltando à sua poltrona. Notei que precisava de desabafar por isso sentei-me no sofá ao lado. Shannon seguiu-me os passos.

-O David disse só que tinha sido um acidente. Afinal o que aconteceu?

-Oh Rita, o que é que aconteceu? Olha filha, da última vez que falámos eu disse-te que íamos a Viseu ter com aquele casal que também tinha filhos da tua idade e com quem antes brincavas muito, lembras-te?

-Sim. –assenti. O “Leto mais velho” deu-me a mão discretamente.

-Pronto. Estávamos a voltar. Era eu quem ia a conduzir e já estava escuro e nós íamos numa estrada deserta, sem iluminação. Quando dei por mim, vinha uma senhora a pé em direção a nós, sem colete, sem nada e para não a atropelar tive de me desviar. Não sei como mas perdi o controlo do carro e acabámos por ir contra uma árvore que lá estava. Eu fiquei assim mas a tua mãe teve morte imediata. Ainda tentaram reanimá-la no local mas não resultou. Maldita a hora em que nós saímos de casa! Eu bem que não queria ir, parecia que estava a adivinhar, mas a tua mãe, teimosa como sempre, insistiu muito e lá fomos.

-Meu deus! –foi tudo o que fui capaz de dizer. Comecei a imaginar todo aquele fatídico episódio. Senti um peso, como se carregasse o mundo inteiro nas costas, um aperto no coração. –Com licença, desculpem! –lavada em lágrimas, tive necessidade de sair dali porque não conseguia olhar para o meu pai. Não porque o culpasse por alguma coisa, não era nada disso. Simplesmente não conseguia. Era demasiado duro pensar que ele estava ali sem ela.

Subi para o quarto e deixei-me cair sobre a cama, tendo ficado a olhar o teto que estava, para irritação dos meus pais em especial da minha mãe, coberto de posters de filmes e de grandes bandas. Ela argumentava que mais tarde ou mais cedo eu ia querer tirá-los e que aí teria de ser ela a limpar o teto, uma vez que eu não seria capaz. Apeteceu-me arrancá-los um por um, desfazê-los em mil pedaços e depois atirá-los para bem longe por ter a noção de que havia provocado discussões que me pareciam agora tão inúteis. Momentos que podiam ter sido bem passados mas que eu tinha desperdiçado.
A nossa relação nunca tinha sido propriamente fácil. Feitios demasiado parecidos, ditava a teoria do meu pai. Contudo ela continuava a ser a minha mãe, o que nos dava “aquela” ligação. Sabia que podia sempre contar com ela, não importava o que fizesse. Estava sempre ali para me apoiar. Bem, não mais...
Dava tudo para poder tê-la de volta, ou pelo menos para poder mudar algumas coisas passadas. Algumas palavras demasiado duras que empreguei sem direito e sem me aperceber do que elas significavam para a pessoa que me tinha trazido ao mundo. Dava tudo para poder dizer-lhe, olhos nos olhos, uma última vez “mãe, adoro-te!”. Tudo, dava tudo! Oxalá fosse possível!
Pus-me de pé e peguei num urso de peluche que se encontrava sentado sobre um puff entre a cama e o alto armário de parede. Matias era o seu nome e tinha-me sido dado pela minha mãe no meu quinto aniversário. Tinha uma aparência dócil, meiga e simpática. Era castanho e de estilo tradicional mas era verdadeiramente adorável e apaixonante.
Envolvi-o com os braços e encostei-me ao guarda-fatos. Fiquei ali, naquela posição até à entrada silenciosa de Shannon, algum tempo depois. Fechou a porta atrás de si.




 Obrigada, Laura Oliveira <3
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